domingo, 20 de março de 2022

Com Poetas

Estava aqui conversando com os poetas e a verdade é que não chegamos a um consenso. Hoje a conta não vai fechar. Hoje estamos todos  bem Renato parafraseando Camões. O ápice com os maus do século é questionar o que tem de tão agradável nessa dor. Vontade de ir e ficar. Vontade de assistir a um filme que já terminamos e  pausamos várias vezes. Você já assistiu algum audiovisual com um poeta? Netflix ou Amazon? Fazia tanto tempo que eu não bebia, mas poetas são companheiros incríveis. Essa gente é tão intensa que apenas uma Stella Artois me deixou chapada. Pouco costume, pouco sangue ou ótimas razões? O que são, afinal, os trinta? Os poetas não sabem. Leminski não ganhou prêmios.  Estamos aguardando a melhor oportunidade. Esperando qualquer uma. São tantos sentimentos nesse quarto. Fernando não tem todos eles, mas Pessoa tem todos os sonhos do mundo. Nunca comentou sobre o dinheiro. O problema é que a conta não fecha. Como diria Nina Morena, "a inflação não favorece os romances latino-americanos". Hoje eu e a Stella estamos na companhia dos poetas, dos filmes e das paredes nas quais tento escrever. Em geral, a gente se resolve lá fora. Todo dia, voltamos radiantes. Somos os sóis das noites. Hoje está chovendo e eu estava aqui conversando com os poetas. A verdade é que a conta não fecha. 

Só isso. 

sábado, 5 de março de 2022

De passagens

Sempre tive medo de mortes precoces. Não pelos jovens, mas pelos bons. Assim como o Renato, vocês sabem o que acontece com eles. Com 17, perdi um amigo. 17s dele, 18s meus. Chorei essa perda com uma amiga de 20 e poucos que nem sequer se despediu. Recentemente, perdi a Mia Zapata. Não a conhecia. Fiquei lendo aquela notícia antiga. Olhando aquela foto tão indigital.... Não tenho medo de morrer.  Nunca tive. Apavora-me não viver com intensidade. Não existe nada de novo nisso. Existe algo de feliz e triste. Feliz, porque já tenho uma vivência intensa. Triste, porquanto também não tenho. Nos fins de semana, férias e feriados - viva, enlouqueço. Durante a semana, sempre morro. É difícil, a gente tem que pagar o que apronta. Até aqui, realizei algumas loucuras orgulháveis. Outras nem tanto. Nada orgulháveis, mas, sim, Loucuras. Memoráveis. Experiências de quase morte. Algumas bem quase. Um pouco irônico quando se detém pavor da morte.  Mas não tenho medo da morte, meu pânico é não viver. Viver sempre significou o exagero: "vamos?" "vamos!", "bebe?", "sim!", "fuma?", "viaja?".... Não é irônico, é icônico que tenha chegado até aqui sem tatuagens e  piercings. É incrível que tenha chegado. Viva, sem tatuagens e piercings. Os trinta  trazem suas imposições. Viver é o exagero. Mas viver, de agora em diante, é o não exagerar. Sempre tive medo de não viver. Durante a semana, sempre morro, mas nesta, irei à praia. Em um mês, um piercing. Um ano, uma tatu. Onde? Tenho o desenho, falta o lugar. Tem tanta coisa que morre precoce. 

terça-feira, 1 de março de 2022

O que eu quero?

Desde dois mil e dez, a minha vida tem sido permeada por constantes mudanças. De cidades, casas, países, contextos pessoais e profissionais. Isso se deve aos meus sonhos. Planejei, executei e alcancei. Não falo isso por arrogância, mas porque sou grata.  Sou grata a Deus, à espiritualidade, ao universo e à sorte. Sim, à sorte. Porque sempre existe um bocado sorte em encontrar apoiadores. Sempre os encontro. Nenhuma vitória é exclusivamente minha. 

As vezes, reflito sobre a minha vida e penso em como teria sido tão mais fácil voltar para a casa dos meus pais depois de terminar a gradução. Ter uma vida mais tranquila, não pagar aluguel, não fazer tudo sozinha. Já dormi no chão, perdi shows, viagens aos quais queria muito ter ido. Passei por coisas bem mais duras que essas. Faria outra vez, mas não indico. Mesmo visionando o mais fácil, mantive-me impetuosa. Espalhei meu mundo por aí. 

Hoje, tenho amigos em diferentes países e alguns convites para trabalhar nesses lugares. Todo dia, considero a possibilidade. Sempre me questiono se o meu grande lance não é  transitar pelo mundo, "ser etéra".  Deixo isso pra lá. O sonho de um concurso no Brasil me trouxe até aqui, não existe a possibilidade de desistir. Além de mim, muita gente acreditou e acredita, inclusive mais que eu. 

Primeira 

Para passar no mestrado, uma das minhas estratégias era ler editais anteriores e descobrir como o processo funcionava. Nessas pesquisas, descobri que a parte curricular era bastante valiosa e que determinados itens valiam mais pontos. Um deles era apresentação de trabalho em congresso internacional. Gente, é muito caro apresentar em um evento desses. Apareceu um, mas era em outro estado. A meta era fazer o que fosse possível para ir até lá. Mesmo determinada, tudo parecia suficientemente impossível. Eu recebia uns 10 reais por hora aula. Nunca sobrava dinheiro - faltava.  Ouvi, repetidamente, que o ideal seria desistir - e era. O sonho falou mais alto.  Fomos eu e a minha fé pedir para atrasar um mês de aluguel. Deu certo. Fui ao evento em março. O resto do ano foi sempre pagando um mês de moradia no outro. Não me orgulho. 

Quando, em dezembro, o décimo terceiro caiu, os assuntos na escola eram as maravilhas que seriam feitas.  Recebi 700, com 650, regularizei o aluguel atrasado. Foi duro. Nesse interim, estudando entre uma aula e outra, acordando de madrugada para ler, ficando sem almoçar, dormindo em cima da escrivaninha, tentando estudar depois trabalho... FUI APROVADA. Último lugar. Meio (0,5) ponto de diferença entre mim e a pessoa que não passou. Meio ponto foi o que me deu a tão almejada vitória. Meio ponto foi o que me separou de um ano de inteiro me sentindo  digna e com as contas plenamente pagas. Separou-me de happy hours e presentes de natal. 

Segunda 

Pouco depois de formada, na mesma época dos dez reais/aula, recebi um amigo que estava em apuros, para passar um tempo na minha casa. Não era uma boa época para ninguém. Dentro das minhas impossibilidades, fiz o meu melhor. Tínhamos um quarto e um banheiro. Foi suficiente. Todos os dias, ele me fazia olhos de gatinho. Época boa. Maquiagem perfeita. Meses depois, ele começou no melhor emprego do mundo e foi morar em outra cidade. 

Chegou a seleção do mestrado, é preciso ter dinheiro. Dinheiro para a inscrição. Dinheiro para o envio de documentos. Para fazer as cópias.... É preciso muito dinheiro. Eu, como sempre, continuava somente com os meus sonhos na carteira. Mas, o meu amigo, não. Agora, ele tinha um emprego excelente. Ofereceu-me e me emprestou 200 reais. Passei. Ele ficou TÃO orgulhoso. Sem bolsa de estudos e morando em capital, demorei anos para conseguir o valor para  quitar o empréstimo. Quem se matou para entrar não teria sossego para fazer o curso. 

Ele jamais aceitou o pagamento. 

Quatro anos depois, sou doutoranda: devo um mestrado, um doutorado e, quiçá, um concurso inteiro. 

Sou grata.  Não só as "minhas vitórias". Não posso desistir.